domingo, 24 de fevereiro de 2008

Carta aos Romanos - 3

O primeiro versículo de Romanos 7 se dirige a pessoas que conhecem a lei, muito provavelmente no sentido genérico da palavra "lei", como disse no meu post anterior. Ainda que escreva a cristãos, Paulo está escrevendo a uma igreja que ele não conhecia, e que tinha algum tipo de informação que dizia como ela era composta, ou seja, de judeus, prosélitos e gentios convertidos. É interessante esta, digamos, "tática" que Paulo usa nas suas cartas, ao mostrar que, de alguma maneira, os seus destinatários eram íntimos seus no sentido de terem algo em comum, neste caso, a lei. A seguir, ele dá um exemplo muito simples, de casamento, o que também é uma forma dele se aproximar mais de uma "platéia" que ele não conhecia, ao tratar de um tema que qualquer pessoa de Roma, naquele tempo, entenderia.

O exemplo da viuvez, que não implicava adultério, é usado por Paulo para mostrar como os cristãos haviam morrido para a Lei (v. 4), para pertencerem a Jesus. Aí há um contraste, já que no exemplo da mulher que enviuvara, ela tinha sobrevivido ao marido para casar-se com outro homem. Agora, quando compara esta situação à Lei e à graça, Paulo diz que quem morreu, por assim dizer, era a Igreja, para a Lei, que de certa forma sobrevivera (pelo menos para os judeus), e a Igreja, morta para a Lei, agora se casaria com o Cristo morto e ressuscitado. Isto coloca um outro contraste: se os judeus deviam ter dado frutos para Deus, através da Lei, como Paulo já falara nos capítulos precedentes, agora essa tarefa cabia à Igreja, morta para a Lei e vivificada pelo Espírito.

No versículo 7, Paulo parte para outro recurso que ele usava para aproximar-se dos seus ouvintes, o da sinceridade. Havia começado Romanos falando genericamente da natureza e da humanidade, havia particularizado um pouco mais ao falar dos judeus e gentios, e agora passa a falar de si mesmo, de maneira sincera, como que desnudando o seu interior, o que sentia, o que passava dentro dele, em relação à Lei e à graça. O exemplo não é mais um casamento, mas, mais do que ele próprio, como ser físico, as suas emoções. Paulo continua construindo seus paradoxos entre lei e graça, dizendo que "o pecado, aproveitando a oportunidade dada pelo mandamento, produziu em mim todo tipo de desejo cobiçoso. Pois, sem a Lei, o pecado está morto" (v. 8 ), uma idéia da Lei como aio (condutor, servo, mordomo) entre o pecado e a morte no Velho Testamento, mas que agora servia como aio para a graça de Cristo, e assim cumprira a sua missão, algo que ele já havia usado na carta aos gálatas, dizendo:

Gal 3:21 É a lei, então, contra as promessas de Deus? De modo nenhum; porque, se fosse dada uma lei que pudesse vivificar, a justiça, na verdade, teria sido pela lei.
Gal 3:22 Mas a Escritura encerrou tudo debaixo do pecado, para que a promessa pela fé em Jesus Cristo fosse dada aos que crêem.
Gal 3:23 Mas, antes que viesse a fé, estávamos guardados debaixo da lei, encerrados para aquela fé que se havia de revelar.
Gal 3:24 De modo que a lei se tornou nosso aio, para nos conduzir a Cristo, a fim de que pela fé fôssemos justificados.
Gal 3:25 Mas, depois que veio a fé, já não estamos debaixo de aio.
Gal 3:26 Pois todos sois filhos de Deus pela fé em Cristo Jesus.
Gal 3:27 Porque todos quantos fostes batizados em Cristo vos revestistes de Cristo.
Gal 3:28 Não há judeu nem grego; não há escravo nem livre; não há homem nem mulher; porque todos vós sois um em Cristo Jesus.

Paulo retoma essa idéia no v. 12, dizendo que "a Lei é santa e o mandamento é santo, justo e bom", mas por meio dela o pecado se revela e coloca em conflito aquele que quer adorar a Deus, pois o bem que deseja, não consegue fazer, pela guerra interna entre o bem e o mal, ou seja, o desejo de agradar a Deus, e a existência de uma Lei que lhe aponta o pecado. Como vencer esta aparente contradição entre a lei que mata e o Espírito que vivifica? Acho que o próprio Paulo explica isso na 2ª carta aos coríntios:

2Co 3:5 não que sejamos capazes, por nós, de pensar alguma coisa, como de nós mesmos; mas a nossa capacidade vem de Deus,
2Co 3:6 o qual também nos capacitou para sermos ministros dum novo pacto, não da letra, mas do espírito; porque a letra mata, mas o espírito vivifica.
2Co 3:7 Ora, se o ministério da morte, gravado com letras em pedras, veio em glória, de maneira que os filhos de Israel não podiam fixar os olhos no rosto de Moisés, por causa da glória do seu rosto, a qual se estava desvanecendo,
2Co 3:8 como não será de maior glória o ministério do espírito?
2Co 3:9 Porque, se o ministério da condenação tinha glória, muito mais excede em glória o ministério da justiça.
2Co 3:10 Pois na verdade, o que foi feito glorioso, não o é em comparação com a glória inexcedível.
2Co 3:11 Porque, se aquilo que se desvanecia era glorioso, muito mais glorioso é o que permanece.
2Co 3:12 Tendo, pois, tal esperança, usamos de muita ousadia no falar.
2Co 3:13 E não somos como Moisés, que trazia um véu sobre o rosto, para que os filhos de Isra desvanecia;
2Co 3:14 mas o entendimento lhes ficou endurecido. Pois até o dia de hoje, à leitura do velho pacto, permanece o mesmo véu, não lhes sendo revelado que em Cristo é ele abolido;
2Co 3:15 sim, até o dia de hoje, sempre que Moisés é lido, um véu está posto sobre o coração deles.
2Co 3:16 Contudo, convertendo-se um deles ao Senhor, é-lhe tirado o véu.
2Co 3:17 Ora, o Senhor é o Espírito; e onde está o Espírito do Senhor aí há liberdade.
2Co 3:18 Mas todos nós, com rosto descoberto, refletindo como um espelho a glória do Senhor, somos transformados de glória em glória na mesma imagem, como pelo Espírito do Senhor.

Creio, portanto, que é esta transformação de glória em glória, vivificados pelo Espírito, que deixamos a Lei para trás e encontramos a liberdade em Cristo. É esta, portanto, a resposta que eu acho que Paulo daria à pergunta que faz a si mesmo, finalizando Romanos 7:

Rom 7:24 Miserável homem que eu sou! quem me livrará do corpo desta morte?
Rom 7:25 Graças a Deus, por Jesus Cristo nosso Senhor! De modo que eu mesmo com o entendimento sirvo à lei de Deus, mas com a carne à lei do pecado.

pra depois, no versículo seguinte, começar Romanos 8 dizendo:

Rom 8:1 Portanto, agora nenhuma condenação há para os que estão em Cristo Jesus.
Rom 8:2 Porque a lei do Espírito da vida, em Cristo Jesus, te livrou da lei do pecado e da morte.

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