quinta-feira, 3 de dezembro de 2009

Novos e velhos fariseus - 2ª parte

Os fariseus dos tempos de Jesus erraram tentando acertar, e, de certa forma, a sua visão reformista e- até certo ponto - liberal da religiosidade judaica da época, contribuiu para o nascimento do cristianismo. Pelo menos é isto o que se pode depreender da opinião de Justo L. González, em seu livro "Uma História do Pensamento Cristão", Ed. Cultura Cristã, 2004, págs. 33/35:



Devemos parar para fazer justiça aos fariseus, tão mal interpretados nos tempos posteriores. O fato é que o Novo Testamento os ataca, não porque eles eram piores do que os outros judeus, mas porque eles eram os melhores - a mais alta expressão da potencialidade humana diante e Deus. Ao vê-los atacados no Novo Testamento, inclinamo-nos a considerá-los simplesmente um grupo do pior tipo de hipócritas, mas aqui erramos em nossa interpretação, não apenas do farisaísmo, mas também do próprio Novo Testamento.

Ao contrário do que freqüentemente imaginamos, os fariseus enfatizavam a importância de uma religião pessoal. Por esta razão, os judeus mais conservadores os acusavam de serem inovadores que atenuavam o jugo da Lei. Numa época em que a vitalidade da adoração no Templo estava em declínio, os fariseus esforçaram-se para interpretar a Lei de tal modo que ela pudesse servir como um guia cotidiano para a religião do povo. Naturalmente, isto os levou ao legalismo que fez deles objeto de tanta crítica e também foi a causa básica de sua oposição aos saduceus. Mas é necessário salientar que os fariseus não eram "legalistas" no sentido de que eles exigiam obediência cega e de má vontade à lei moral e aos preceitos rituais - halakah - pois uma grande parte daquilo que nos restou de sua literatura é devocional, homilética e denota um esforço humano de trazer à tona obediência voluntária à vontade de Deus - haggada.

Os saduceus eram os judeus conservadores do século 1º. Eles aceitavam apenas a Lei escrita como sua autoridade religiosa, não a lei oral que tinha sido desenvolvida da tradição judaica. Deste modo, eles negavam a ressurreição, a vida futura, a complicada angelologia e demonologia do Judaísmo mais recente, e a doutrina da predestinação. Nisso eles se opunham aos fariseus, que aceitavam todas essas coisas; e por essa razão o Talmude lhes chama - ainda que de forma um tanto inexata - "epicuristas". A religião dos saduceus se centrava no Templo e em seus ritos, e não na sinagoga e em seus ensinos. Assim, não é surpreendente o fato dos saduceus desaparecerem logo depois da destruição do Templo, enquanto que os fariseus quase não foram afetados por este evento.

Em contraste com os saduceus, os fariseus se propuseram a tornar a religião uma parte da vida íntima diária. Como os saduceus, sua religião centrava-se na Lei, ainda que para os fariseus "Lei" não fosse apenas a Lei escrita, mas também a oral. Esse legado oral, transmitido ao longo dos séculos de tradição e interpretação, servia para aplicar a Lei escrita às situações concretas da vida diária, mas também serviu para introduzir inovações dentro da religião de Israel. É por isso que os saduceus, conservadores por natureza, rejeitavam todo possível uso da Lei oral, enquanto que os fariseus - conjugando esforço com os escribas - apressavam-se em defendê-la.

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