domingo, 8 de abril de 2012

Páscoa no cristianismo primitivo

Trecho de artigo do Dicionário Patrístico e de Antiguidades Cristãs transcrito no e-cristianismo:
I. O Conteúdo teológico da festa. R. Cantalamessa mostrou como é necessário distinguir, na tradição cristã, duas concepções da Páscoa, que se originam ambas do judaísmo.

1. A tradição judaica. No início, a Páscoa é uma festa nômade (provavelmente em relação com a transumância); o rito do sangue do cordeiro aspergido na arquitrave e nos umbrais da porta tem um significado de esconjuro: deve proteger contra o Exterminador. Na religião israelita, aquele que “passa” é Deus, que poupa as casas de seu povo (Ex 12,27). A esta primeira concepção acrescentou-se uma segunda: a Páscoa foi posta em relação com a lembrança do êxodo do Egito, que recorda aos israelitas a libertação do homem de sua escravidão (Ex 13,8.14; Dt 16,1). No judaísmo helenista (cf., por ex., Fíl., Leg. spec. II, 147), e no posterior à destruição do segundo Templo, esta concepção antropológica da festa prevaleceu sobre a primitiva.

2. A tradição cristã. Jesus morreu por ocasião de uma Páscoa judaica (quer se trate de 14 de Nisan, segundo a cronologia de S. João, quer de 15 de Nisan, segundo a cronologia dos sinóticos). Esta coincidência não podia deixar de influir sobre a tradição cristã. Assiste-se a uma progressiva “pascalização do acontecimento da Sexta-feira Santa, com base na interpretação tipológica do AT. Característico é o fato de que, desde as origens, as duas concepções judaicas sobre a Páscoa estejam presentes na tradição cristã (cf. 1Cor 5,7-8). Todavia, podem-se distinguir dois tipos de teologia pascal:

a) no tipo asiático, a Páscoa é posta em relação com πασχειν/passio e recebe uma significação quase exclusivamente cristológica (o conteúdo da festa é a comemoração do passado e a férvida expectativa dos acontecimentos escatológicos). É esta Páscoa quartodecimana que se reflete, entre outras, na homília Sobre a Páscoa de Melitão de Sardes. Notemos, no entanto, que a Páscoa romana não se diferencia da festa asiática por seu conteúdo, mas apenas pela data (a origem da Páscoa romana poderia aliás remontar, também ela, à Igreja primitiva).

b) no tipo alexandrino, a Páscoa é posta em relação com a ideia de transitus-passagem, e assume uma significação quase exclusivamente antropológica (passou-se da sombra à realidade, vive-se no presente, antecipando a verdade escatológica e celeste; a tendência à “desistorização” da festa é aqui bem clara). É esta a teologia de um Clemente, de um Orígenes, que se confundirá com a tradição asiática na patrística grega posterior.

c) na patrística latina, que se baseia sobretudo na tradição asiática, a tradição alexandrina se introduz a partir de Ambrósio (De sacr. I, 4, 12; De Cain et Abel I, 8, 31; Ep. 1,10) e de Jerônimo (Comm. In Evang. Matth. IV, 26,2). Será mérito de Agostinho operar uma nova síntese cristológica das duas tradições, com base em Jo 13,1 (Tract. in Evang. Ioh. 55,1). “Foi com sua paixão que o Senhor 'passou' da morte para a vida e abriu para nós, crentes, a via para sua ressurreição, a fim de que nós passemos da morte à vida” (Enarr. in Psalm. 120,6; cf. De civ. Dei XVI, 43). Esta síntese lhe permite – e permitirá a seus sucessores – combinar o aspecto histórico, sacramental, místico e escatológico da festa da Páscoa.

Leia a íntegra do artigo no e-cristianismo



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