quinta-feira, 19 de novembro de 2015

Como abraçar um muçulmano


A curiosa experimentação social começou muitos meses atrás, quando o mundo ainda estava em choque pelo surgimento do Estado Islâmico, mas não tão apavorado pela selvageria e pelos atentados que se seguiram.

O programa se chamava "Blind Trust Project" ("Projeto Confiança Cega") e consistia em posicionar um rapaz de pé nas ruas de Toronto (Canadá), com os olhos vendados, braços abertos, e com dois cartazes: um dizia "eu sou muçulmano e sou rotulado como terrorista", e o outro "eu acredito em você. Você acredita em mim? Dê-me um abraço então!".

Veja o que aconteceu:


Algum tempo depois, a experiência ocorreu num lugar ainda mais complicado, em Mumbai (antigamente denominada Bombaim) na Índia, onde a histórica rivalidade entre hindus e muçulmanos já levou a guerras e conflitos constantes entre Índia e Paquistão.

Pois foi exatamente lá que um muçulmano se posicionou numa rua com um cartaz dizendo "eu sou muçulmano e acredito em você. Você acreditaria em mim o suficiente para me dar um abraço?".

O resultado você pode ver no vídeo abaixo:



Já houve inclusive a versão francesa do "abrace um muçulmano" pós-ataques a Paris na sexta-feira 13 passada, com os mesmos dizeres e uma profunda emoção, conforme você pode ver no vídeo abaixo:




É interessante ver como as pessoas reagem aos estereótipos, e depois de uma desconfiança inicial se dispõem a encarar os medos individuais e coletivos.

Peço licença aos leitores para contar uma experiência pessoal que ilustra bem o que quero dizer.

Em maio de 2014, durante um voo de Las Vegas (Nevada) a Charlotte (North Carolina), presenciei uma cena que confrontou meus medos e preconceitos.

O voo é longo, dura mais de 3 horas, e confesso que, logo no embarque, estranhei a presença de 5 jovens tipicamente muçulmanos, com suas vestes e barbas que chamavam a atenção.

Confesso que, por um instante, pensei o pior, mas logo me acalmei. 

Afinal, com toda aquela segurança nos aeroportos dos Estados Unidos, em que o passageiro é revistado, tocado, scaneado e quase despido, a probabilidade de alguém mal-intencionado passar incólume é praticamente nula.

Os aviões americanos que fazem os trajetos nacionais têm uma configuração um pouco diferente daquela que estamos acostumados no Brasil.

Os banheiros ficam no meio do avião e os passageiros são instruídos repetidas vezes para não aglomerar na frente deles.

Eu estava sentado numa poltrona do lado do corredor duas fileiras atrás do banheiro, com um jovem militar devidamente fardado na poltrona de trás e, lá pelas tantas, estranhei o fato de um daqueles jovens - aparentemente muçulmanos - estar parado em frente ao banheiro, lívido, se sentindo - ao que tudo indicava - bastante desconfortável.

Novamente, me acalmei e voltei a ler a revista que estava em minhas mãos quando, alguns minutos depois, houve uma barulhenta comoção generalizada logo à minha frente.

Levei alguns instantes (que pareciam uma eternidade) para reparar que o rapaz muçulmano havia desmaiado, e algumas pessoas se reuniam em volta dele para socorrê-lo.

Felizmente, havia vários médicos no avião retornando de um congresso médico em Las Vegas e todos foram rápidos e bastante solícitos em socorrer o rapaz que imediatamente teve uma poltrona liberada ali do lado para se recompor, enquanto recebia os cuidados dos profissionais habilitados para tanto.

Confesso que, por alguns segundos, meu coração saltou à boca e imaginei o pior, mas logo fui alegremente surpreendido pelo fato de que há pessoas que não se assustam com os estereótipos e se apressam em fazer o melhor que podem para socorrer alguém. 

Vergonha para mim.

Chegamos todos sãos e salvos a Charlotte e, na sala de conexões, os mesmos 5 rapazes apareceram para tomar um voo para Londres no portão ao lado daquele que me traria de volta a São Paulo. 

Pausa, claro, para refletir sobre como nossas reações são condicionadas pelo medo (e pelo inconsciente) coletivo e - felizmente - na imensa maioria das vezes, estamos equivocados.

Claro que tudo que tem acontecido no mundo em termos de fanatismo, decapitações, terrorismo e intolerância religiosa não pode ser explicado na simplificação de um discurso do abraço, mas não custa nada sonhar e manter a esperança de que dias melhores virão.

É o que nos resta, afinal!

Jamais despreze o poder de um abraço. Sim, pode ser que um abraço mude o mundo. 

Pelo menos um pouquinho...



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