segunda-feira, 1 de maio de 2017

Absolvida médica acusada de mortes em UTI do Hospital Evangélico de Curitiba

Sem dó.
Antes de ser julgada, Virgínia de Souza virou caricatura, foi apelidada de "Dra. Morte" e massacrada pela imprensa.
Agora, absolvida em 1ª instância, resta saber quem lhe devolverá a honra e o trabalho que ela não pode mais exercer. 

Bom, quem já teve o desprazer de estar internado com lucidez dentro de uma UTI por alguns dias, como é o caso deste que vos escreve, tem uma noção clara do que significa tentar salvar uma vida, o que nem sempre é possível.

De repente, do nada surge uma movimentação gigantesca de toda a equipe de intensivistas, médicos e enfermeiros, para tentar fazer a ressuscitação de alguém que acabou de morrer. 

Algo um tanto quanto assustador para um "leigo" ver. E não é só isso...

A gente passa por experiências desagradáveis e traumáticas como, por exemplo, perceber que a taquicardia da paciente idosa ao lado não cede a nenhuma medicação, permanecendo entre 160 e 170 batimentos por minuto, selando seu destino em questão de dias ou horas.

Por outro lado, vemos momentos de profunda emoção como os filhos já adultos dessa mesma paciente com taquicardia que se revezam nos horários de visita para chorar ao lado de sua cama, tocá-la, massageá-la e dizer o quanto toda a sua família a ama e que todos a querem de volta ao convívio do lar.

Deve ser este amor que a mantém viva. Ou mantinha... já que quando saí da UTI ela continuou lá, não sei o que lhe aconteceu afinal.

Os "felizardos" que estão na UTI em condições de observar seu cotidiano se tornam, assim, espectadores privilegiados dos constantes embates entre vida e morte.

Essa é uma das experiências extremas da vida (e da morte) que ninguém - em sã consciência - gostaria de ter, mas, cá entre nós, todos deveriam por ela passar.

Ajuda demais a encarar a vida como ela realmente é. 

O que vale e o que não vale a pena viver...

Feitas essas considerações pessoais, ficou muito famoso o caso da médica intensivista Virgínia de Souza, que trabalhava na UTI do Hospital Evangélico de Curitiba (PR) e foi acusada de ter provocado a morte de centenas de pacientes terminais, tendo sido apresentada ao mundo como a maior "serial killer" de que se tinha notícia.

Sorte dela que ainda havia um juiz em Curitiba com disposição de não surfar na onda da opinião pública, aferir a acusação, ouvir a defesa e julgar com isenção.

Agora, devidamente processada e julgada, a Dra. Virgínia de Souza foi absolvida por falta de provas, razão pela qual a entrevista abaixo, concedida por ela ao G1 Paraná (com vídeo na página indicada), se reveste de profundo interesse, sobretudo numa época de julgamentos apressados para satisfazer as massas ignaras e constante cerceamento de defesa por quem deveria garanti-la:

'Ficaram ofendidos porque eram cobrados', diz médica sobre quem a denunciou por mortes em UTI

Virgínia de Souza foi inocentada por juiz que analisou a denúncia do Ministério Público.

A médica Virgínia Soares de Souza falou em entrevista ao Fantástico sobre as denúncias que a levaram à cadeia. Em 2013, ela e mais sete colegas foram acusados de antecipar mortes de pacientes internados na Unidade de Terapia Intensiva (UTI) do Hospital Evangélico, em Curitiba. Em abril deste ano, todos foram inocentados, em primeira instância.

Ela acredita que as pessoas que fizeram a denúncia anônima à polícia se sentiram ofendidas pela forma como ela tratava os colegas dentro da UTI que chefiava. "[Foi] porque se sentiram ofendidos, ofendidos porque eram cobrados", avalia.

De acordo com a denúncia, ela e os outros colegas aplicavam coquetéis de remédios que levavam os pacientes à morte. O objetivo era liberar vagas na UTI, para outros pacientes. Por ser um hospital que oferece atendimento pelo Sistema Único de Saúde (SUS), o Evangélico vive no limite da lotação máxima, em todos os setores.

Com a repercussão do caso, a polícia passou a analisar mais de 300 mortes que aconteceram na UTI do Evangélico, entre 2006 e 2013. As autoridades começaram a tratar esses casos todos como suspeitos.

Para a imprensa internacional, Virgínia chegou a ser considerada "a maior serial killer de todos os tempos". No entanto, a denúncia ateve-se apenas a poucos casos, onde exisitiram os indícios da conduta mortal.

Na sentença, porém, o juiz Daniel Avelar disse que, diante das provas apresentadas e das testemunhas ouvidas, não havia como comprovar a relação entre as ações de Virgínia e as mortes. Por essa razão, ele absolveu todos os réus.

Limites éticos

Virgínia diz que sempre trabalhou nos limites éticos, para garantir que os pacientes sob a responsabilidade dela pudessem se salvar. "Eu era conhecida mais como uma obstinada do que pelo motivo que eu fui acusada. Obstinado é um médico que chega a ultrapassar, vamos dizer, os protocolos e as regras e faz de tudo pelo resgate da vida", afirma.

Além da absolvição em âmbito jurídico, Virgínia foi inocentada em seis dos sete processos que foram abertos contra ela no Conselho Regional de Medicina do Paraná. O sétimo caso ainda não foi julgado.

Vida nova

Após as denúncias, Virgínia foi demitida do hospital em que trabalhou por 25 anos. Nesses quatro anos, ela fez cursos e hoje trabalha em casa, em um serviço de pesquisas por telefone. "Eu vou manter esse trabalho", diz.

Ela afirma que jamais vai voltar a trabalhar em uma UTI, ainda que não tenha perdido o registro como médica. "Por mais, vamos dizer, que a minha imagem seja modificada, pode haver uma dúvida em alguém e eu não suportaria isso nunca", diz.

MP vai recorrer

O Ministério Público do Paraná não concorda com a decisão de Avelar. Para o promotor que cuidou do caso, o juiz deixou de lado parte das provas apresentadas. Ele crê que Virgínia e os outros profissionais eram, de fato, culpados. "Porque nós entendemos que essa sentença foi insuficiente pra tantas provas existentes no processo.

Inclusive, a interceptação telefônica que guarda consonância com a aplicação dos medicamentos anotados no prontuário. O MP entende que então, há muito mais provas que precisam ser analisadas", diz.

Ele ainda acrescenta que há provas periciais que demonstram a conduta criminosa do grupo. "A verdade é que essas pessoas foram assassinadas naquela UTI. O MP não tem duvida e vai continuar lutando por isso pq nós temos provas fundamentadas em perícia médica oficial", afirma.

Caso o recurso seja aceito pelo Tribunal de Justiça do Paraná, (TJ-PR), os oito acusados ainda poderão responder pelos supostos crimes que teriam cometido, podendo ser condenados ou absolvidos. A decisão caberá aos desembargadores paranaenses.



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